quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

***** A historiografia cristã na História (parte 8)


Conclusões

Para atender a delimitação apresentada na introdução, nos propusemos a pensar nos valores do diálogo entre a filosofia e a historiografia, identificar os problemas e a continuidade do estilo deixado por Eusébio e, por fim, ensaiar uma aplicação de uma história problematizada da religião cristã quando esta se aliara ao Império Romano.

Das escolas historiográficas mencionadas entendemos que os Annales têm as propostas que melhor atenderiam às carências desta historiografia cristã de caráter apologético, que tem na História Eclesiástica de Eusébio seu primeiro e máximo modelo. A problematização da história proposta pelos Annales é um fator teórico que se colocado em prática por historiadores da igreja, demonstrará que a capacidade de interpretar o passado poderia dar início a uma nova história do cristianismo.

Conforme observamos em dado momento, a continuidade deste estilo defensivo deixado por Eusébio está bem presente nas obras de história da igreja publicadas na segunda metade do século XX, mesmo após tantos avanços na historiografia. Isso nos parece bastante grave, pois não só demonstra a preocupação do reprodutor em cristalizar supostas verdades históricas e teológicas, como também anula a capacidade que o pesquisador tem de analisar seu objeto de investigação, o passado humano, seja individual ou coletivo, e em se tratando da cristandade, mais coletivo que individual.

Podemos afirmar com segurança que no âmbito da formação intelectual, as escolas e faculdades de teologia onde a disciplina de história da igreja é obrigatória, ainda há muito a ser desenvolvido. Na ambiência católica, a partir das obras de Jean Daniélou, Henri-Irénée Marrou, Jean Delumeau, Alain Corbin entre outros, tem havido bastante abertura para uma história da igreja repensada. Porém, em seminários protestantes, salvo raras exceções, ainda prepondera a adesão a obras que repetem o estilo eusebiano.

Na aplicação propomos uma relação entre este exercício de problematizar a história e o objeto de pesquisa de mestrado com o qual estamos trabalhando. A própria idéia de que o Constantino que chegou até nós não é necessariamente um “Constantino histórico”, mas o Constantino construído por Eusébio demonstra-nos que este objetivo de problematização da história da transição vivida pela cristandade no século IV poderá ser bem sucedido com o desenvolver da pesquisa. É o que almejamos!

Há muito ainda para ser explorado, descoberto e, no sentido da nossa proposta, interpretado. Assim, consideramos que esta relação entre o exercício interpretativo e o trabalho do historiador pode contribuir sobremaneira para uma renovação de fato nos estudos de história das religiões e, no nosso caso, de história do cristianismo.

Referências bibliográficas
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Um comentário:

Erik disse...

Fala meu mano,

Foram muito bons esses seus textos sobre a A historiografia cristã na História, a neutralidade e o trabalho de pesquisa foram fantásticos, como eu particularmente ainda não tinha visto.

A necessidade de imparcialidade e honestidade é fundamental no estudo da história seja ela religiosa ou não, a mesma sempre deve assumir papel autônomo e independente.

A análise crítica da versão romanceada de Eusébio da História da Igreja, principalmente no que diz respeito a Constantino é de fundamental importância para a compreensão da tendenciosidade historiográfica cristã até os dias de hoje.

Mais uma vez parabéns meu amigo e obrigado por esse presente que foram esses textos.

Grande abraço e até amanhã, rs

Erik