sábado, 9 de junho de 2012

Reflexão (82) - Celebrando a vida


por Jefferson Ramalho

Os meus amigos e ex-irmãos cristãos que me desculpem, mas hoje não posso mais dizer que sou cristão; já fui, tanto na versão católica quanto evangélica, ainda preservo muitos elementos do cristianismo em minha conduta, mas não posso mais afirmar que sou cristão. Isso, contudo, não significa que eu tenha me convertido a outra religião, tampouco que eu tenha me tornado ateu. O que serei no futuro em matéria de crença ou de descrença, ainda não sei, mas o fato é que opto atualmente pela sensatez do agnosticismo.

Chamo de sensatez porque entendo que seja muito mais sincero e coerente afirmar que ingenuamente acredito na existência de uma condição divina, superior, além da condição humana, mas que é impossível de ser interpretada. Em outras palavras: ainda acredito em deus, mas confesso que não sei como ele é. A teologia cristã, minha primeira formação “acadêmica”, já não mais me seduz com a sua arrogante pretensão em dizer como deus é ou como é a vida após a morte. Nem a versão mais ortodoxa, tampouco a moderada, muito menos a mais aberta, heterodoxa ou liberal – como queiram – conseguem me fazer acreditar que deus é do modo como elas afirmam que ele seja.

Alguns, certamente, dirão mais uma vez que estou me expondo. Penso que qualquer pessoa que uma vez tendo optado por participar de redes sociais, se há uma coisa com a qual ela não se preocupa é com a exposição de sua própria imagem. Claro que ninguém, exceto minha esposa, sabe como é hoje a minha vida no momento em que a porta é trancada, em que a roupa é tirada e a luz apagada. Mas tornar públicas ideias, opiniões, críticas, dúvidas, crenças e descrenças, está pra além de expor a imagem de si próprio. Quando resolvi torna-me um escritor, assumi um compromisso comigo mesmo: escrevo não para que muitos me leiam, mas para que aqueles que me lerem sintam-se provocados, atingidos. Meu livro, e os próximos, pois pretendo voltar a publicar em breve, meus textos do blog, são – e eu sei – verdadeiros fracassos de vendas. Esta, porém, nunca foi a minha preocupação. Antes, o que mais quero é polemizar, pois se tem uma coisa que percebo desde a infância é que a polêmica incomoda, sobretudo, a quem está no poder. E se tenho duas missões na vida, uma delas é a de nunca querer alcançar o poder já que este só pode ser alcançado através ou do abuso, ou da mentira, ou da violência, ou da manipulação, ou da exploração do outro; a minha segunda missão seria a de expor quem está no poder ao ódio, à revolta, à raiva, à contradição, à vergonha, à de ter de reconhecer ou pelo menos não conseguir demonstrar que sem o poder elas não são nada e que venderiam a alma se fosse preciso para não perdê-lo. Por isso, sou polêmico!

Neste ano duas perdas atingiram significativamente os meus sentimentos. Perdi no final de fevereiro minha tia Rosa, com quem convivi os quatro primeiros anos de minha vida, mas com quem pude manter uma relação de extremo carinho em toda a infância, pois passava quase todas as minhas férias escolares com ela, sempre a recebíamos em nossa casa e sua companhia, apesar do temperamento forte que ela tinha – além de reclamona – sempre foi pra mim maravilhosa, carinhosa, indispensável. De todos os seus sobrinhos, tenho certeza, sempre fui o único que pra ela telefonava em todo dia 6 de janeiro para desejar feliz aniversário. Tanto que teve apenas um ano – acho que em 2010 – em que acabei não ligando na data e aí ela disse: neste ano, ninguém (nem o Jefferson) me ligou para me dar parabéns.

A outra perda irreparável que vivenciei neste ano – exatamente uma semana depois da morte da minha tia Rosa – foi a do meu avô Alcides, meu padrinho de batismo, avô materno, parceiro fiel na hora de ouvir modas de viola. Um homem que sempre amou viver. Ainda não consegui conceber que estaremos reunidos em família nas festas de aniversário, almoços de dias das mães ou dos pais, e ele simplesmente não estará conosco. Mesmo já tendo perdido algumas pessoas no passado, estas duas perdas me fizeram perceber que a morte realmente existe. Sim, parece uma afirmação absurda e um tanto quanto imatura, mas é isso mesmo. A morte só se mostra real, quando ela consegue roubar da gente quem realmente amamos. Ainda choro muito quando me lembro dele.

Apesar da minha apostasia, não consigo simplesmente concluir que suas almas se evaporaram. Quando chorávamos e os tocávamos durante os velórios, não só lamentávamos pelas perdas dos seus corpos. Também, mas muito mais pela certeza de que nunca mais ouviríamos suas vozes, nunca mais veríamos seus sorrisos, nunca mais sentiríamos as suas presenças. E são estas as composições da condição humana que os vermes não podem devorar, que a terra não pode comer. Por isso me pergunto, em que lugar estão as suas almas? Como já não sei mais acreditar piamente em céu, em inferno, em purgatório ou em reencarnação, prefiro em acreditando, pensar que as suas almas não deixaram de existir, afirmar que não sei para onde elas foram. Embora Ludwig Feuerbach, Karl Marx, Artur Schopenhauer e principalmente Friedrich Nietzsche sejam hoje os meus filósofos preferidos, continuo ainda muito platônico quando o assunto é vida após a morte. Só nunca vou saber como se dá tal imortalidade da alma, se é que ela existe.

A alegria da vida está no fato de que podemos celebrá-la, apesar dos desencontros, das perdas, das lágrimas que vem quando a saudade toma conta da gente, das tristezas e das boas lembranças. E celebrar a vida significa se alegrar com o fato de que se alguns vão embora, outros chegam. Não que haja uma espécie de substituição. Impossível! Pessoas que amamos são definitivamente insubstituíveis. Prefiro chamar esta experiência de compensação. Sim, pois se no início do ano perdemos pessoas que sempre foram amadas por nós, agora chega para abrilhantar nossa família, fazer a alegria voltar a tomar conta de nossos corações e trazer felicidade – muita felicidade – uma linda criança. Nasceu na quinta-feira, dia 7 de junho, Heloísa, minha mais nova prima. Uma verdadeira jóia, um presente da vida, um instrumento que, apesar da fragilidade peculiar de um bebê, é forte o suficiente para esculpir o sorriso que há muito não aparecia com nitidez em nossos rostos. Contudo, a obra de arte não somos nós, as “meras esculturas”, mas ela, Heloísa, o “instrumento vivo” que, repleto de ternura e pureza, nos traz a paz. Heloísa, seja muito bem-vinda entre nós; você é muito amada por todos!

Muito feliz,
Jefferson

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Caros amigos leitores, Nos próximos dias, graças à conclusão do meu mestrado, estarei voltando a postar minhas reflexões. Grato pela paciência e desculpas pela demora! Abraços, Jefferson