sábado, 19 de janeiro de 2013

Reflexão (84) - Afinal, ele é Deus ou não é?



por Jefferson Ramalho

Poucos sabem que em 2008 lancei um livro chamado:  “Jesus é Deus? – uma reflexão sobre a divindade de Cristo na História”. Pois bem, esta publicação corresponde ao meu trabalho de graduação interdisciplinar, apresentado e defendido em banca examinadora na Universidade Mackenzie, para obtenção do meu título de bacharel em teologia, cerca de três anos antes.

Hoje, quando apresento o livro a alguém e a pessoa vê que o título é uma pergunta, logo ela me devolve a mesma pergunta. Sinceramente, sinto vontade de dizer: leia, por favor, e saberá. Mas, opto por responder de diferentes maneiras, considerando sempre quem está perguntando.

Mas, o mais comum e correto, em minha opinião, é dar a seguinte resposta: Depende! Se a pessoa perguntar “por que?”, eu responderei: Simples, você quer que eu diga se Jesus é Deus a partir de qual perspectiva? Posso lhe responder como historiador, como cientista da religião, como teólogo e como religioso. O que prefere?

Sim, porque sou um pouco das quatro coisas. Estou tentando ser historiador, pois não passo de um licenciado em História que almeja o doutorado na mesma área; recentemente consegui me tornar mestre em Ciências da Religião; sou teólogo de formação, mesmo porque o tal livro foi resultado de uma pesquisa teológica e, finalmente, embora sem frequentar qualquer culto religioso há pelo menos dois anos, ainda me considero um religioso, pois mantenho em mim uma certa e bastante agnóstica espiritualidade que muito despretensiosamente costumo chamar de fé.

Se for para eu responder como historiador, direi: Não, Jesus não é Deus! Trabalho com a hipótese de que houve uma personagem histórica chamada Jesus de Nazaré, que com o passar dos primeiros séculos da nossa era, aos poucos, foi sendo divinizado pelos que se identificavam como seus seguidores. E esse processo de divinização foi consequência de uma série de interesses: religiosos, políticos, sociais e econômicos. Portanto, como historiador, tenho certeza de que Jesus não foi Deus, mas um simples líder de um pequeno grupo dentro do judaísmo que, com o tempo, ganhou forma, cresceu e se tornou numa das principais religiões mundiais, sem que ele (Jesus), inclusive, tivesse pretendido isso quando reuniu seus primeiros companheiros.

Como cientista da religião, mesmo que em diálogo com a história e com a teologia, direi: não importa! Isso mesmo, não importa se ele era ou não Deus. O que importam são os efeitos que a sua história tenha causado entre aqueles que optaram por segui-lo, independentemente do momento, do lugar e sob que formato. O que importam são os modos como alguns pensamentos lhe foram atribuídos e, mais do que isso, aceitos e rejeitados ao longo do tempo. O que importam são os modos como suas ideias e história terrena tenham sido reproduzidas em formas de texto, imagem, pintura, escultura, música e rito. Logo, veremos que estas reproduções, ora lhe apresentarão como humano, ora como divino, ora como humano e divino, enfim, importam estas formas, sem que haja de minha parte o compromisso de afirmar que ele foi Deus ou não só porque a arte, a letra, o pincel,... assim o mostraram.

Se me perguntam se Jesus é Deus esperando uma resposta teológica, responderei: depende de qual corrente teológica eu sigo. Se eu for ortodoxo dogmaticamente falando, responderei sem titubear que ele é Deus e sempre será, literalmente. Se, porém, eu for um teólogo heterodoxo, direi, por exemplo, que sua divindade é muito mais uma metáfora como afirma John Hick ou um símbolo do divino como diz Roger Haight, mas, jamais, uma divindade no sentido literal e completo conforme afirmaram teólogos clássicos como Santo Agostinho, Santo Atanásio, Santo Anselmo, Santo Tomás de Aquino, Martinho Lutero, João Calvino e Karl Barth.

Finalmente, se esperarem de mim uma resposta de um religioso, direi: não sei, pois como agnóstico, não conheço os mistérios daquilo que está além da nossa realidade. Prefiro dizer que não sei por uma razão simples. Se eu disser que tenho certeza de sua divindade, estarei mentindo, pois alguns anos de estudo sobre o longo processo que levou à convicção dogmática da divindade de Jesus foram suficientes para fincar um gigantesco ponto de interrogação em minha mente, e isso, mesmo eu sendo alguém que ainda crê em alguns absurdos da fé, não posso desconsiderar. Sou daqueles que entendem a dúvida não como algo prejudicial à fé, mas contribuinte, pois me livra de voltar a acreditar em invenções de líderes religiosos desonestos.

Contudo, mesmo com essa dose forte de agnosticismo que tomou conta de mim de algum tempo para cá, não consigo abrir mão daquilo que sei e vivi, enquanto ser humano – e isso vem antes da academia, da filosofia, da ciência, da razão, da dúvida – que foi um encontro genuíno com a Graça Absoluta de Deus, por meio da compreensão que pude ter da singularidade que representa e significa o sacrifício de Jesus, e este, neste caso, não somente como Jesus, mas como Jesus e como Cristo. Cristo é a palavra grega que traduz o hebraico Messias. Em outras palavras: o ungido, o escolhido e, na perspectiva cristã, mais que tudo isso, o Deus Encarnado.

Eu prefiro continuar crendo, duvidando e, convicto, de que independentemente da resposta correta para a pergunta que serve de título ao meu livreto, Jesus deixou um exemplo e um ensino de amor e solidariedade que valem muito mais que qualquer dogma construído teologicamente acerca de sua pessoa, sobretudo, quando tal exemplo e tais ensinos são colocados em prática por mim, que quase sempre não passo de um imprestável ser humano.

na Graça, mas sempre com dúvidas; 
Jefferson

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