quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Reflexão (35) - Calvinismo disfarçado - introdução


por Jefferson Ramalho


O que significa ser calvinista? Há quem diga que ser calvinista é acreditar na predestinação segundo o pensamento de João Calvino. Quem faz essa afirmação, ainda não entendeu o conceito do termo "calvinista".

Ser calvinista é muito mais do que isso. Há uma quantidade enorme de pensamentos defendidos por João Calvino e seus primeiros seguidores que fazem destes últimos, calvinistas autênticos. E isso não se refere apenas à questão do pensamento soteriológico do reformador.

Contudo, por causa da reação dos calvinistas do século XVII ao pensamento de Armínio, a soteriologia calvinista tornou-se a principal marca daqueles que se identificavam como seguidores da teologia de Calvino.

Hoje, passados 500 anos, está bastante claro que a maioria esmagadora dos protestantes e evangélicos é arminiana. Poucos aceitam os chamados 5 pontos do calvinismo. São capazes de aceitar que satanás será redimido no dia do Juízo, caso se arrependa do que fez, mas as soteriologias de Calvino e dos calvinistas do século XVII - que no fim das contas são a mesma soteriologia - são absurdos que jamais uma mente sã poderia aceitar.

Nos próximos dias pretendo escrever o que realmente penso sobre a soteriologia calvinista. Não sou totalmente calvinista por uma razão simples: O pensamento de João Calvino é amplo demais para eu dizer que sou calvinista só porque concordo com a sua soteriologia. É possível que haja outras reflexões no pensamento de Calvino que eu não conseguiria concordar. Por isso, prefiro dizer que sou calvinista apenas na sua proposta soteriológica.

Para concluir este preâmbulo sobre o que vou escrever a respeito desse tema nos próximos dias, gostaria de salientar que tenho sido profundamente alimentado espiritualmente por literaturas que têm sido publicadas atualmente na área de espiritualidade.

Uma delas é a obra do escritor Brennan Manning. Sem dúvida, Brennan é um autor como nenhum outro nos nossos dias. Mas percebo que conquanto ele critique o calvinismo em alguns momentos, ao mesmo tempo usa muitos argumentos que só o calvinismo - e antes de Calvino, Santo Agostinho - têm, quando resolve falar sobre a Graça. Parece que em muitas vezes - não poucas - Brennan Maning é um calvinista disfarçado.

Seus argumentos em defesa da Graça que é capaz de salvar sem pedir nada em troca e de fazer ao homem o que este jamais poderia fazer a si mesmo, são exatamente os argumentos que homens como Santo Agostinho, João Calvino e Martinho Lutero usavam quando defendiam a "doutrina" da predestinação, a idéia de salvação imerecida, a certeza do favor de Deus ao homem pecador etc.


É sobre isso que iremos refletir nos próximos dias. Convido você a esta aventura, pois lembre-se: calvinista, por incrível que pareça, às vezes
também consegue pensar. Acho que eu sou um deles.

Abração!

na Graça,

Jefferson

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Reflexão (34) - A volta do filho pródigo


por Jefferson Ramalho


A parábola do filho pródigo é uma das mais conhecidas de toda a Bíblia.

Mas há detalhes contidos nessa estória inventada por Jesus, que apenas alguns mestres do conhecimento conseguiram perceber.

Na pintura, o quadro do holandês Rembrant foi a obra que melhor representou em forma de imagens o que a parábola ensina.

Na literatura, após uma análise concentrada e ao mesmo tempo repleta de sensibilidade diante da pintura de Rembrant, o sacerdote católico Henri Nouwen detalhou ainda mais a parábola, compartilhando em seu principal livro A volta do filho pródigo, tudo o que há de verdades espirituais naquele texto do Evangelho de Lucas.

Na música, repleto de simplicidade, ninguém além do compositor brasileiro Stênio Marcius conseguiu transformar em poesia, letra e música, o que o Mestre quis ensinar ao narrar a parábola.

Abaixo, a pintura de Rembrant. Após a pintura, a letra de Stênio Marcius.

Abração a todos!

na Graça,

Jefferson



















Fim de tarde no portão
(Stênio Marcius)

Fim de tarde no portão
A cabeça branca ao relento
Teimosia de paixão
Faz das cinzas renascer alento

Na estrada o seu olhar
Procurando um vulto conhecido
Espera um dia abraçar
Quem diziam já estar perdido

O seu amor é tão forte
Mais que o inferno e a morte
São torrentes que arrebentam o chão
Mais fácil secar os mares
Apagar a estrela Antares
Que arrancar o amor do seu coração
Fim de tarde,
se debruça no portão

Mas um dia aconteceu
E o moço retornou mendigo
O pai depressa correu
E abraçou o filho tão querido

Tragam roupas e o anel
Calcem logo os seus pés, milagre!
Vinho do melhor tonel
Tanta alegria em mim não cabe

O seu amor é tão forte
Mais que o inferno e a morte
São torrentes que arrebentam o chão
Mais fácil secar os mares
Apagar a estrela Antares
Que arrancar o amor do seu coração
Fim de tarde,
está deserto o portão

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Leia comigo (10) - Teologia sistemática no horizonte pós-moderno


Caros amigos,


Abaixo, seguem os fragmentos que selecionei do 2º capítulo do livro do professor Alessandro Rocha, entre as páginas 86 e 116.

Boa leitura!

"[Nas palavras de Leonardo Boff], Deus é identificado com os conceitos que dele fazemos. Ele habita nossos conceitos e nossas linguagens. Elaboramos doutrinas sobre Deus e sobre o mundo divino, doutrinas que se encontram nos vários credos e nos catecismos. Com tal procedimento tentamos encher de sentido último e pleno nossa vida. Deus pode ser encontrado na intimidade do coração."(p. 86s)

"Uma vez constituído, o discurso sistemático sofre o risco da própria natureza, ou seja, de sua condição sistematizadora. Esse risco consiste em sua identificação como uma peça acabada capaz de comunicar sentido para além das fronteiras da cultura que o gerou. Ao abrigar em seu interior um sistema, esse discurso pode acabar servindo somente como instrumento sistemático, ou seja, como seu reprodutor, iniciando assim um círculo que acaba por excluir tanto a experiência de fé originária quanto qualquer outra mediação cultural."(p. 89)

"
O método deve estar, portanto, a serviço do discurso teológico, quanto a permitir que se realize a cognoscibilização da . Ou seja, que a experiência de tenha na mediação cultural um veículo capaz de se aproximar do horizonte existencial completo de cada comunidade, em qualquer tempo histórico-cultural, para que assim o discurso sistemático construído nesse espaço seja relevante a essa comunidade."(p. 93)

"Diferentemente dos discursos unívocos e apologéticos e mesmo dos documentos escriturísticos, a fé em si não é 'firme fundamento'. Ela torna-se fundamento à medida que aquele que a experimenta reage à sua insegurança, ou mesmo à inexistência desses fundamentos."(p. 79)

"
Sem a dimensão da mediação cultural, haveria uma polarização entre experiência de e discurso sistemático, uma incomunicabilidade que inviabilizaria qualquer discurso minimamente relevante. Sem mediação cultural, a experiência de não transmitiria nenhum sentido existencial, e o discursos sistemático não passaria de peça literária cristalizada, fria e absolutamente irrelevante, dada tão-somente à reprodução sistemática de corte apologético."(p. 82)

"
Boff também discute a questão: 'Deus transcendente é representado como o Deus acima do mundo e, o que é pior, fora do mundo [...] Representado como totalmente fora do mundo, Deus de fato não seria experimentável'. E conclui: 'Esse Deus está muito próximo do Deus do deísmo [...] Não é um Deus que se abaixa com profunda simpatia para com o ser humano. Não assume a nadidade humana. Mas conserva, contrariamente ao que diz Paulo [v. Fp 2.6,7] uma majestática e transcendente divindade'."(p. 97s)

"
Deve haver 'um trabalho hermenêutico, que rompe com toda e qualquer possibilidade de dogmatização da teologia'."(p. 99)

"
Todo o processo de desistoricização do discurso teológico serve a um propósito específico, que é a afirmação da univocidade da verdade. Uma vez garantida essa univocidade, faz-se necessária ainda sua manutenção, ou seja, o controle de toda discursividade dissonante. Mas, como pergunta Foucault, 'o que há enfim, de tão perigoso no fato de as pessoas falarem e de seus discursos proliferarem? Onde, afinal, está o perigo?' ."(p. 106)

"
A teoria de Foucault sobre a análise do discurso é, sem dúvida, bastante adequada à análise do discurso teológico sistemático. Pretende-se aqui, no entanto, contribuir com uma análise que não se limita a Foucault, mas que a partir dele dialoga com outras perspectivas de produção de mecanismos de controle do discurso sistemático."(p. 109)

"
O 'magistério protestante' é, portanto, quem seleciona os agentes do discurso, que irão reproduzi-lo em sua dimensão totalizante e universalizante. Os agentes são pessoas concretas, porém o “magistério” não é o somatório dessas pessoas, sendo, antes, a instituição guardiã do discurso unívoco. Ao ingressar nele, o agente deve abrir mão de sua condição concreta, bem como de seu horizonte existencial, para reproduzir e defender aquela verdade que supostamente emanou da essência das coisas."(p. 110s)

Na próxima semana tem mais.

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Amanhã teremos uma nova Reflexão.

Abração!

na Graça,

Jefferson

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Reflexão (33) – Espiritualidade verdadeira


por Jefferson Ramalho

O que é espiritualidade? Diante de tantas obras publicadas a respeito desse assunto, fica difícil estabelecer um conceito único. E as obras que se dizem de espiritualidade, não são todas necessariamente escritas por cristãos protestantes. Na verdade, há espiritualidade segundo os conceitos católicos, segundo os conceitos espíritas e até mesmo segundo os conceitos budistas.

O fato é que esse tema tomou conta de boa parte das prateleiras das grandes livrarias, religiosas ou não. Mas antes disso, o anseio por uma espiritualidade verdadeira tomou conta dos corações e das almas das pessoas. Não apenas no Brasil, mas no mundo todo, fala-se muito, escreve-se muito e aspira-se muito uma espiritualidade autêntica que é capaz de trazer consigo uma bagagem repleta de paz, honestidade e acima de tudo, amor.

Neste sentido, conceitos teológicos à parte, as espiritualidades dos cristianismos católico e protestante, do budismo, do espiritismo ou de qualquer outra vertente religiosa, pregam a paz entre os homens, o fim das guerras, das corrupções, das infinitas formas de violência que existem, exceto a suposta espiritualidade dos fundamentalistas cristãos, islâmicos etc.

Enfim, são esses os objetivos da espiritualidade verdadeira, a qual pretende mostrar tais questões como sendo urgências que todo ser humano tem carregado dentro de si, tanto enquanto indivíduo como enquanto membro de uma sociedade.

Teologias e dogmas à parte novamente, pois há momentos em que conceitos teológicos não servem para nada a não ser para separar em vez de unir os seres humanos, a espiritualidade autêntica pode ser praticada de diferentes ou semelhantes formas, definida de iguais ou distintas maneiras, mas ela é única quando se trata de uma possibilidade do ser humano se auto-compreender.

Quando a espiritualidade é praticada, os conceitos teológicos e as formas podem ser as mais distintas, mas se ela é feita com pureza de coração e intenções humildes e sinceras diante do Sagrado, os resultados são sempre positivos. A auto-percepção, por exemplo, é uma das conseqüências imediatas e mais relevantes. Relevantes, porque é somente enxergando a si mesmo, que o ser humano consegue enxergar o seu próximo que se encontra aflito, angustiado, necessitado e carente de uma mão fraterna estendida e não com gestos de acusação, como quase sempre acontece.

Os que não se percebem, até conseguem enxergar o outro, mas o outro que peca, que está desviado da vontade de Deus, que está caído e que merece ser castigado por isso. Isso é o que eu chamaria de "Espiritualidade do fariseu". O fariseu, por ser extremamente ortodoxo e obediente à Lei, não consegue se enxergar, logo não consegue enxergar o outro. E quando enxerga o outro, o faz com uma capacidade enorme para acusar e julgar, sem piedade e sem misericórdia.

Quando nós enxergamos a nós mesmos, e isso é possível através dos exercícios de contemplação, silêncio e meditação – que são práticas comuns da espiritualidade clássica – automaticamente conseguimos enxergar o nosso próximo com outros olhos. Contemplamos nossa impureza e incapacidade, que nos leva a perceber o quanto somos carentes de misericórdia, graça e perdão. O quanto precisamos de uma mão estendida para nos ajudar e não uma mão apontando para nos acusar.

Se eu me vejo dessa forma, logo eu verei o meu próximo com as mesmas limitações, e não o tratarei mais como um pecador maldito que precisa ser julgado, disciplinado pelo sistema e envergonhado diante da comunidade, mas alguém que precisa ser amado, abraçado e acolhido.

E esse acolhimento somente o Senhor – para nós cristãos – pode oferecer. Mas não necessariamente de maneira sobrenatural, transcendente, distante, mirabolante, sobre-humana. Como diz meu amigo hebraista, prof. Edison Alonso, “não precisamos apelar pra metafísica sempre que formos falar a respeito das ações do Sagrado”. Na verdade, o Senhor oferece este acolhimento aos seres humanos necessitados, através de outros seres humanos necessitados.

É o chamado compartilhamento. Compartilhamento de bens, de sentimentos, de tempo, de vida. Grosso modo seria o seguinte: Vamos permitir que Deus seja Deus em nós para outras pessoas. Isto é espiritualidade verdadeira. Uma espiritualidade que me faz experimentar o que homens do passado como Isaías experimentou e disse: Ai de mim, que sou um homem de lábios impuros.

Quando contemplamos o Sagrado, o próprio Sagrado nos leva a enxergar o que há de mais profano em nós, para que eu não venha mais tratar a condição igualmente profana do meu irmão de outra maneira que não seja com misericórdia, graça e amor. É essa Espiritualidade que para mim faz sentido, independentemente da marca religiosa. E o resto é apenas resto.

na Graça,

Jefferson

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Uma oração

Pai,

Sou fraco, ingênuo, pecador, soberbo, vingativo e perverso. Tudo isso habita dentro de mim. Não consigo me livrar dessas coisas. O que faço, Senhor?

Estou vivendo na própria pele a carência de alguém que sabe o quanto precisa de Deus, que o tem como Pai, mas não o sente agindo. Será que precisamos senti-Lo?

Deus não é palpável, nem sentido – na verdade, Ele é sem sentido – habitável, reduzível ao tempo e ao espaço, teologizável. Sua Soberania ultrapassa todas essas condições tão limitadas.

São peculiaridades que temos e que tomam conta de nossas impuras almas, que não desejam essencialmente servir a Deus, mas a si mesmas. Com isso, ficamos cada vez mais distantes dEle, que é santo, puro, sem corpo, sem tempo, sem espaço e sem vingança.

Ele é amor, é ilimitado, é santo de fato, é acessível, é limpo, essencialmente limpo. Eu não; eu sou imundo, sujo, e não tenho tempo para Ele. Tenho para minhas intenções perversas, que muitas vezes, ainda que sejam puras e sinceras, tornam-se perversas, quando se tornam substitutas do meu relacionamento com Ele.

Critico os que barganham, mas quantas e quantas vezes não penso em barganhar também? Desprezo a teologia da prosperidade, mas quando foi que aceitei trabalhar ou prestar serviços voluntários a alguém? Não apenas precisamos, mas também queremos dinheiro. Não estou aqui justificando as aberrações existentes no meio evangélico a esse respeito, mas estou pedindo ao Pai, para que despreze o meu pecado e me faça entender que a encarnação da Graça, acerca da qual tanto falamos, é realmente o perdão. E se os que fazem e estimulam a barganha, estiverem no céu? Eu vou me revoltar com Deus por causa disso?

O perdão, antes de tudo, precisa me atingir, se preciso, violentamente a alma. Só sendo perdoado e entendendo o que é o perdão do Altíssimo, é que conseguirei perdoar o meu próximo. Mas Jesus disse o contrário: Perdoe primeiro, para depois ser perdoado. Isto não é absurdo? Não parece barganha? Faça e depois te será feito, se não, nada feito.

Que ensinamento é esse, Senhor? Jamais conseguirei perdoar. Parece um espinho que foi empurrado em minha pele mais frágil e não pode ser arrancado. Já que não podes e não vais me arrancar tal espinho, então me faça experimentar Tua Graça do modo que for possível. Sentindo, vivendo, enfim, experimentando de alguma maneira. É o que me basta: a Tua Graça.

O perdão que devo conceder ao meu irmão, não posso produzir em mim. É obra do Senhor!

Obrigado, Pai, por ter me perdoado, mesmo sabendo que eu não perdoaria.

constrangido por causa do Teu grande amor,

Jefferson

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Leia comigo (9) - Teologia sistemática no horizonte pós-moderno


Caros amigos,


Abaixo, seguem os fragmentos que selecionei do 2º capítulo do livro do professor Alessandro Rocha, entre as páginas 70 e 84.

Boa leitura!

"O que se propõe neste segundo capítulo é evidenciar as influências da sublevação da metafísica (v. Glossário) no interior do discurso teológico cristão, em sua dimensão metodológica, preponderantemente em seu corte sistemático-dogmático. Como resultado dessas influências, observa-se, em primeiro lugar, a dogmatização dos temas da , instrumentalizados no âmbito da univocidade discursiva própria da teologia apologética. Em seguida, esses temas dogmatizados são sistematizados em forma de tratados, para logo após serem circunscritos no âmbito da manualística, de tendência marcadamente universalizante." (p. 71).

"como diz Paul Tillich: Fé não é, portanto, um ato de forças irracionais quaisquer, assim como também não é um ato do inconsciente; ela é, isto sim, um ato em que se transcendem tanto os elementos racionais como não-racionais da vivência humana." (p. 75s).

"É na abertura para a transcendência que homens e mulheres encontram o terreno apropriado para a experiência de fé." (p. 76).

"Diferentemente dos discursos unívocos e apologéticos e mesmo dos documentos escriturísticos, a fé em si não é 'firme fundamento'. Ela torna-se fundamento à medida que aquele que a experimenta reage à sua insegurança, ou mesmo à inexistência desses fundamentos." (p. 79).

"
Sem a dimensão da mediação cultural, haveria uma polarização entre experiência de e discurso sistemático, uma incomunicabilidade que inviabilizaria qualquer discurso minimamente relevante. Sem mediação cultural, a experiência de não transmitiria nenhum sentido existencial, e o discursos sistemático não passaria de peça literária cristalizada, fria e absolutamente irrelevante, dada tão-somente à reprodução sistemática de corte apologético." (p. 82).

"
Embora pareça claro que o discurso teológico não possa prescindir da cultura como instância que promove mediação a partir da linguagem (de determinada linguagem), permitindo assim seus postulados, isso não se verifica no caso da teologia sistemática manualista (que é o objeto desta pesquisa). O que se pode perceber é a cristalização de uma mediação cultural (a metafísica) que impede qualquer outra. Dessa forma, o arco de elementos que compõe o horizonte existencial de homens e mulheres concretos não é identificado no interior desse discurso." (p. 84).

Na próxima semana tem mais.

Compre este livro no link:

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Amanhã teremos uma nova Reflexão.

Abração!

na Graça,

Jefferson

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Reflexão (32) - Autoridade corrompida


por Jefferson Ramalho


“Igreja com autoridade para evangelizar pessoas!”
É o que diz o lema de uma determinada comunidade em frente da qual eu passei no sábado, em uma cidade do litoral paulista. Embora minha reação imediata tenha sido de espanto, não resisti à tentação e acabei soltando uma piadinha para quem estava ao meu lado: E daria para evangelizar cavalos, em vez de pessoas? É cada uma que a gente vê! Obviamente, as gargalhadas foram inevitáveis. Minhas e de quem estava comigo.

Infelizmente é esse tipo de coisas que vemos em placas de igrejas, nos folhetos de divulgação sobre cultos de “milagres”, nos boletins informativos que recebemos ao entrar naquela igreja tradicional que freqüentamos, enfim, nos mais diversos meios utilizados pela igreja institucional.

O maior de todos os problemas, em minha limitada maneira de enxergar as coisas, não está em existir erros ortográficos, porque isso sempre terá mesmo, principalmente em igrejas onde os pastores não são formados, mas desinformados, onde o rebanho é estimulado a não estudar porque o importante na vida cristã é a unção e não o conhecimento, enfim, onde tudo o que cheira reflexão e exercício da intelectualidade representa ameaça à “fé”.

Penso que o maior problema está na não existência de autopercepção, isto é, onde quem manda no negócio, não consegue se enxergar, e mais do que isso, quer levar outros juntos com ele. É o típico farisaísmo. Por outro lado, esses espertalhões, conquanto não consigam perceber suas próprias bestialidades, quando o assunto é dinheiro, eles não são nem um pouco burros, mas são especialistas, doutores, verdadeiros catedráticos...

E aí minha pergunta é: que autoridade é essa, meu Deus? Eles dizem que têm autoridade, mas fazem exatamente aquilo que o conceito neotestamentário de autoridade diz que não deve ser feito. Eles não querem servir, mas serem servidos. E quando servem, pensam em retorno. Se o retorno não for possível, nada feito.

Jesus ao lavar os pés dos discípulos, deixou claro que aquele ato representava melhor do que qualquer outro o conceito de autoridade que os seus seguidores deveriam assumir para si. Autoridade, portanto, não é mandar nos outros, não é falar mais alto que os outros, não é pregar somente aos domingos à noite, não é vestir as melhores vestes sacerdotais, não é nada disso. Autoridade, no Novo Testamento, é servir. E servir é amar, é abrir-mão do que se tem para compartilhar com quem não tem, é se doar, é se sacrificar muitas vezes, é negar a si mesmo, é não se preocupar com reconhecimentos ou recompensas, é não negociar com Deus ou com o próximo, é não trocar ofertas e ajudas por o que quer que seja.

Se alguém “serve” pensando em ser servido, ainda não aprendeu o que é autoridade conforme o Evangelho. Se alguém doa algo pensando na recompensa que poderá vir de Deus ou do próximo a quem se está servindo, ainda não entendeu o que o Mestre ensinou sobre amar o outro como Ele nos amou.

E o amor com o qual Ele nos amou, o fez se servir a outros, o fez se entregar, o fez ir à Cruz sem reservas, sem barreiras, sem condicionamentos, sem trocas, sem negociações, e do ponto de vista humano, sem garantias. E nós? Temos ido à Cruz por alguém? Quando gritamos para o mundo que temos autoridade para evangelizar – pessoas, é claro – pensamos que esta evangelização consiste em serviço à comunidade onde estamos inseridos, ainda que os membros desta comunidade não queiram fazer parte de nossas reuniões? Claro que não. A igreja institucional, quase sempre, quando serve, pensa em ser servida. Ouvimos absurdos do tipo: _Vamos ajudar, mas a pessoa precisa vir pra igreja.

Isso não é autoridade, tampouco evangelização. É negociação, é interesse, é barganha, é tratar as pessoas como se não se fossem pessoas. Isso, na maioria dos casos, é a chamada “igreja evangélica”!

na Graça,

Jefferson

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Reflexão (31) – Manipuladores manipulados

por Jefferson Ramalho

É muito comum ouvir em seminários teológicos que o neopentecostalismo conseguiu chegar aonde chegou, devido à habilidade que os seus líderes têm para manipular as massas. Essa não é uma afirmação incorreta.

Contudo, por causa do tempo de vida que as igrejas neopentecostais já têm, não é correto dizer que todos os seus líderes são apenas manipuladores. O problema é mais grave ainda. Muitos que hoje estão à frente de igrejas e comunidades locais das chamadas mega-igrejas evangélicas são pessoas que “se converteram” naquele ambiente mesmo, e, sempre aprenderam aquelas aberrações como verdades fundamentadas no Evangelho. Aí reside o tal problema.

Os antigos discípulos se tornaram mestres, mas não deixaram de ser discípulos de seus antigos líderes. Hoje continuam sendo manipulados, pois permanecem aprendendo a mentira como se fosse verdade, e mais do que isso, eles também encaminham tais mensagens aos novos discípulos, fazendo uso da mesma estratégia de manipulação com a qual foram "formados".

Há denominações em que para ser líder é necessário entrar no jogo da manipulação de massa, porque se o cara não consegue persuadir e conseqüentemente arrecadar bastante dinheiro, ele não tem vocação para o “ministério”.

Obviamente há exceções, e sobre isso eu nem precisaria me referir, contudo, as não exceções predominam. Quem está por cima da carne-seca são os vigaristas, mesmo. Aqueles que transformaram a Bíblia em um manual de arrecadação de dinheiro, de manipulação de pessoas simples de mente e coração, de fantasias inescrupulosas, e tudo isso, para que o caixa esteja cada vez mais abastecido.

Algumas personagens bíblicas jamais seriam um desses líderes evangélicos. Jeremias é um deles. Para quem conhece um pouquinho da sua história e dos seus lamentos, nem é preciso dizer o porquê. Seria um péssimo manipulador.

O que então dizer de Noé? Será que ele conseguiria levantar o dinheiro que esses “pastores” levantam? Será que ele faria as proezas que estes caras fazem? E Jesus, coitado?! Seria um fracasso! Não teve coragem de pular do pináculo do templo para mostrar ao diabo o quanto era poderoso, logo, seria chamado de “crente sem fé”. Jamais teria sido um líder com a ousadia dos pastores neopentecostais que são especialistas em mostrar ao diabo o quanto são poderosos.

É isso aí. Poderíamos listar aqui inúmeros exemplos bíblicos de fracasso à luz daquilo que o neopentecostalismo chama de derrota. Triunfo passou longe da vida dos heróis da Bíblia. Se eles foram reconhecidos como heróis da fé lá em Hebreus, não adianta nada. Nem cinzas mais existiam deles, quando aquele texto foi escrito. Os crentes atuais são convidados à vitória e ao triunfo hoje e agora.

Abraão nunca soube que foi chamado de "pai da fé", e, se ele fosse neopentecostal, teria ficado furioso com Deus, porque só teria graça ser reconhecido como "pai da fé" enquanto estivava vivo e não séculos após a sua morte. É esta a essência da mensagem do neopentecostalismo. Prosperidade já! Reconhecimento já! Status, honra, triunfo,...

Tudo porque aqueles que um dia foram manipulados continuam sendo, e, além disso, se tornaram sem perceberem, manipuladores também. E este ciclo não pára. À medida que essas mega-igrejas “crescem”, os manipuladores aumentam, a manipulação nunca termina.

Diante disso, confesso que não sei o que deve ser feito em relação a eles: orar, protestar, convidá-los ao arrependimento, desafiá-los a um debate ou a um diálogo, enfim, não sei o que deve e o que pode ser feito. Talvez, não haja nada a se fazer. Eles estão nas mãos do Altíssimo e Este sabe muito bem o que faz!

na Graça,

Jefferson